terça-feira, 29 de maio de 2007

Quatro meses

Fez, por estes dias, 4 meses desde que a aventura chinesa se iniciou. É cedo para fazer balanços, mas é uma altura extremamente oportuna para uma das clássicas comparações “antes e depois”. Como a que a Rita faz aqui.

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Diferenças

Segundo conta a minha mãe, umas das maiores vergonhas que a fiz passar foi quando, ainda na Coimbra Natal, exclamei, alto e bom som, enquanto cruzava uma passadeira: “Mãe, aquele senhor tem a cara pintada de preto!”

A expressão do primeiro contacto consciente com um tom de pele diferente, no meu caso, reflecte a ingenuidade e pureza com que as crianças observam o Mundo. Lembro-me amiúde desta história quando me cruzo com crianças na China e revejo aquele que, imagino, terá sido o meu olhar de espanto, nos olhos amendoados de cada uma delas, fixando-me curiosamente.

Normalmente a curiosidade torna-se em vergonha quando as confronto directamente com o desconhecido e lhes mostro a língua ou lhes digo “hello”. Em lugares mais turísticos não escapo às objectivas dos pais que querem eternizar o primeiro contacto das suas crias com o Estrangeiro. Imagino, brincando, em quantas salas de estar chinesas já estarei eu, emoldurado.


Na China, a julgar pela capa do meu livro, sou efectivamente diferente e sinto-o cada dia nos olhares de crianças e adultos anónimos.

quarta-feira, 16 de maio de 2007

Putuoshan

O frio que se entranhou nos meus ossos durante os primeiros tempos da minha aventura chinesa começa já a dar lugar a um calor abafado que se adivinha insuportável nos meses vindouros. Foi neste pegajoso contexto que me propus iniciar a busca de uma alternativa refrescante ao clima urbano circundante.


Putuoshan é uma das centenas de ilhas que compõem o arquipélago de Zhoushan na costa de Ningbo, na província de Zhejiang, suficientemente próxima de Shaoxing para merecer uma visita de fim-de-semana e com atractivos mais que suficientes para a justificar – praia, marisco... e budismo. Putuoshan alberga uma das 4 montanhas budistas da China, o que a torna, para além de um famoso destino turístico, num importante local de peregrinação.



O tempo, incrivelmente quente durante toda a semana, resolveu presentear-nos com aguaceiros durante o tempo que passámos na ilha. O que, no fundo, talvez não tenha sido um mau presente, uma vez que refreou as nossas intenções de mergulhar numa água de cor, no mínimo, duvidosa! E se as praias dificilmente poderiam ter impressionado os excursionistas brasileiro e português, já os petiscos mostraram estar à altura do desafio, quer em variedade quer em qualidade, a fazer lembrar os saudosos festivais de marisco algarvios que se aproximam, tão perto e tão longe.


quarta-feira, 9 de maio de 2007

Longsheng, Guangxi (Dragon Backbone Terrace)

No norte da província de Guangxi, esconde-se mais uma das paisagens cartão-postal que decoram paredes de agência de viagem – os terraços de arroz de Longsheng. O pouco tempo disponível obriga a comprar a viagem-pacote que facilita o turismo mas simultaneamente o despoja da maior parte dos atributos que normalmente tornam o viajar uma experiência tão inesquecível. Se os pudesse concentrar numa palavra, essa seria a cada vez mais subvalorizada – improviso. Porque o improviso pode, sim senhor, fazer com que não “aproveitemos” tão bem o sempre escasso tempo disponível, com que não vejamos tudo aquilo que teríamos gostado de ver, mas é normalmente o improviso que nos possibilita os momentos mais inesquecíveis de qualquer viagem. Porque ninguém volta de Paris e diz que o melhor momento da viagem foi quando subiu ao topo da torre Eiffel. O melhor momento se calhar foi num café dos subúrbios a conversar com dois descendentes de árabes sobre sorrisos de francesas. Se calhar porque se confundiu o autocarro 23 com o 223. E isso não vem incluído em nenhuma viagem de pacote.


A evidência é que chegar a Longsheng sem ser através da viagem de pacote obriga a um despender do recurso Tempo, de que simplesmente não disponho (o recurso Paciência depende dos dias mas normalmente tenho de sobra). Rendo-me ao pacote e acordo antes das 7h da manhã de modo a ter todo o tempo do mundo para parar nos locais previamente escolhidos à hora previamente acordada onde as minorias étnicas nos esperam para nos presentear com os seus espectáculos tradicionais a troco de uma módica contribuição pecuniária. Adiante.



A pequena aldeia de Ping’An, em Longsheng, no Norte da província de Guangxi, tem cerca de 700 habitantes, todos pertencentes à minoria Zhuang. Têm o seu próprio dialecto (que me dizem ser mais próximo do vietnamita do que do chinês), a sua própria forma de vestir e as suas próprias tradições e costumes. A sua própria identidade.
Através de um engenhosos sistema de irrigação conseguem manter cultivos (maioritariamente de arroz) no topo das montanhas para onde foram “empurrados” no passado , o que lhes tem permitido garantir a sua subsistência desde há mais de 500 anos. O efeito visual é, contudo, impressionante e tem atraído nos últimos anos um grande número de visitantes. A chegada do turismo, ainda que em pequena escala, por enquanto, alterou o modus vivendi desta pequena sociedade e imagina-se que num futuro próximo as plantações de arroz sejam mantidas apenas para efeitos turísticos.



A paisagem, a construção, a simbiose homem-natureza são na realidade impressionante e mereciam mais algum tempo de deslumbramento. Tempo de que infelizmente não disponho. Sobra algum (tempo, claro) para, sempre a correr, tentar encontrar os ângulos que melhor ilustrem aquilo que as palavras normalmente se esforçam (quase sempre com pouco sucesso) por transmitir. Encontro dois ou três e volto a correr para baixo. Literalmente a correr.

Melhor momento do dia? Almoço numa esplanada a meio da montanha, em Ping’An, temperado com ideias sobre um pouco de tudo na companhia dos hermanos Ana e Orestes. O almoço não estava incluído no pacote.



segunda-feira, 7 de maio de 2007

Yangshuo, Guangxi

Aproveitei o feriado de Maio para rumar a Sul. Destino – Província de Guanxgi. Yangshuo, pequena cidade na margem do rio Li, popular destino para backpackers de todo o mundo, foi o local escolhido como base de exploração da zona.


A paisagem rural circundante é uma das mais famosas e reproduzidas de toda a China, ilustrando, por exemplo, o verso das notas de 20 Yuan. O rio e seus afluentes, que banham a maior parte das povoações da zona, estendem-se por entre intermináveis planícies de arroz das quais se erguem, imponentes e misteriosas, colinas de um verde luxuriante, concorrendo para a criação de um cenário absolutamente fantástico, por onde me perdi sobre duas rodas e onde dormitei, mais tarde, embalado pelo motor de um barco local.



Pedalando entre colinas e arrozais, surpreendi-me com locais onde o tempo deixou de passar e com outros onde o turismo começa a fazer chegar novas formas de subsistência, tal como a esplanada improvisada na casa de um camponês de Liugong (uma das muitas pequenas aldeias perdidas por entre arrozais), que, aproveitando a magnifica vista para o rio de que dispõe, se decidiu a enveredar pelo universo dos serviços. Uma assoalhada, apenas com uma cortina como divisão para o quarto onde dorme toda a família, pode ser suficiente para construir um restaurante neste mundo onde o almoço é morto e depenado na hora e onde as inspecções sanitárias ainda não são senão uma miragem.


E que dizer da Lulu? Nascida camponesa, juntou a pouca vontade que tinha de passar o resto dos seus dias de costas voltadas para o Sol com um talento inato para falar inglês e tornou-se empresária, dona de uma pousada e três bares na mundana West Street da simultâneamente calma e agitada Yangshuo. O chinese dream come true?



A imersão neste universo natural deslumbrante, torna-o num destino idílico para quem procura um pouco de afastamento das buliciosas cidades chinesas. Não por acaso, para além de backpackers e omnipresentes turistas internos, misturam-se em abundância com a fauna nativa reformados europeus e americanos.

Despeço-me de Yangshuo, observando-a, serena, do topo de uma das colinas circundantes, com um sincero até breve, levando na bagagem agradáveis recordações e incontáveis sorrisos.