sexta-feira, 27 de julho de 2007

O novo meio de transporte

Rendi-me às evidências e comprei uma bicicleta. Havia vários incentivos para o fazer: A cidade é pequena e plana, as bicicletas são baratas e são um meio refrescante de locomoção, quando não se pedala com muita velocidade, obviamente. Por outro lado, os táxis são muito baratos e têm ar-condicionado... mas a principal razão por que não comprei uma bicicleta assim que aqui cheguei foi mesmo o medo de voltar para casa dentro de um paralelepípedo de madeira depois de ter sido atropelado por um camião de suínos que não parou no sinal vermelho.


Hoje em dia, completamente adaptado às diferentes regras de trânsito em vigor por estes lados, já sou eu quem não respeita qualquer convenção imposta pela minha matriz ocidental e, para espanto até dos nativos mais temerários, atravesso qualquer rua em qualquer circunstância, independentemente do tom cromático do bonequinho que dita as acções dos peões.



Agora, em cima da minha bicicleta comprada em promoção no recém-inaugurado Carrefour, que ao fim do primeiro dia já fazia todo o tipo de ruídos como que a anunciar a sua breve partida para o mundo dos defuntos, sinto que ganhei uma nova vida, uma nova vontade de enfrentar a Jiefang road (a única verdadeira rua de Shaoxing) e de me perder nas ruelas que nela desembocam.

Montado na minha bicicleta, qual Quixote em cima do seu Rocinante, anseio por lutar contra os moinhos de vento das ruas de Shaoxing.

Ou então sou apenas mais um chinês em cima de uma bicicleta.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

Mito nº 1 - Os chineses comem tudo o que mexe

Existe um ditado, salvo erro originário do Sul da China (ou será do Norte?), que diz que todos os animais que caminhem de costas para o céu se podem comer.

Se é certo que seria impensável encontrar em Portugal (ou em qualquer outro país europeu, para esse efeito) muitos dos petiscos que já vi por aqui, não é menos verdade que na maior parte dos restaurantes que frequento nunca encontrei cão no menu... nem baratas, nem macacos, nem nenhum outro animal com potencial para nos tirar o apetite.


Escorpiões, estrelas do mar e baratas só os encontrei no Norte e em locais específicos para espantar os turistas. Não duvido que existam em outros lugares mas a verdade é que à maioria dos chineses que conheço nunca passaria pela cabeça enfiar na boca um animal que vive nos esgotos.

O Macaco continua a ser um mito por desvendar. Não tenho provas que não se coma nem do contrário. Mas mais uma vez, acredito que haja lugares onde seja possível encontrar, apesar de não existirem propriamente macdonald’s locais a vender miolo de macaco com topping de morango.



Por último, o melhor amigo do homem é em geral bastante apreciado. Garantem-me que é melhor que qualquer outra carne e que é um alimento muito “quente” (calórico?) e, logo, óptimo para o Inverno. Nunca a encontrei à venda no supermercado nem nos restaurantes “melhorzinhos” mas é um facto que ela anda por aí.

No Sul, na província de Guangxi, era comum encontrar nas típicas tascas de rua o animal retratado em baixo. Se olharem com atenção, conseguem distinguir, entre uma série de elementos indistinguíveis, um animal com uma cauda comprida. Alguém consegue adivinhar do que se trata?

terça-feira, 17 de julho de 2007

Fugindo ao calor

Com os termómetros a atingirem preocupantes 38 graus, acompanhados por humidade sempre na casa dos 80%, tem sido uma preocupação constante encontrar alternativas refrescantes aos ares-condicionados caseiros. Excluindo, à partida, as piscinas públicas (por falta de sex-appeal)e a praia (por manifesta impossibilidade prática), os lagos são os melhores companheiros de fim-de-semana.

Nanjing foi uma agradável surpresa, com o seu lago-género-piscina-do-povo, mas Shaoxing rapidamente ganhou a dianteira, com uma fantástica lagoa de água tépida e transparente. Podem não ter os encantos da praia de Faro, mas também não têm os problemas de falta de estacionamento

Nanjing

Shaoxing

sexta-feira, 13 de julho de 2007

O Centro do Mundo

Representação chinesa do mapa-mundo

O Etnocentrismo consiste, grosso modo, em considerar uma cultura, normalmente aquela de que fazemos parte, superior a outra. Em países como a China, onde a população tem hábitos que dificilmente poderiam ser mais distintos dos nossos, é fácil ceder à tentação de considerar que a nossa cultura é melhor que a deles e o que não falta são motivos para o justificar. O que falta muitas vezes é um pouco de ponderação para questionar quais as razões que justificam essas diferenças. E normalmente elas sobram.

Eles cospem para o chão, não respeitam filas nem prioridades, empurram-se uns aos outros nos transportes públicos... a lista é interminável e é em argumentos como estes que os ocidentais se sustentam quando consideram a sua cultura superior.

Eu não gosto que me empurrem no metro (quando vou a Xangai, leia-se), faz-me impressão, mais que o acto de cuspir em si, o ruído que o precede, e (e esta é uma das pequenas coisas que mais me incomoda) não suporto a forma como eles sorvem ruidosamente o chá. Os modos à mesa, por outro lado, que já causaram momentos de indisposição a algumas visitas recentes, já deixaram de me incomodar.

Tenho as minhas razões para acreditar que as comparações entre culturas (principalmente quando envolvem os termos “superioridade” e “inferioridade”) são normalmente nefastas e pouco construtivas. Principalmente quando falamos de um país como a China onde, há muito pouco tempo, foi cometido um dos maiores atentados contra a Cultura jamais testemunhados e que, ironicamente, ficou conhecido como Revolução Cultural. Afinal o Mundo é um moinho, e o que hoje é dado como adquirido amanhã pode já não ser verdade. Tudo bem, ninguém pode negar (e nenhum chinês com o mínimo de bom-senso o nega) que as filas são um método muito mais eficiente que o “tudo ao molho e fé em Deus”, mas se é verdade que há coisas que eles podem aprender connosco (e já o estão a fazer), não é menos verdade que o oposto também é possível.

No fundo, aquilo que pretendo dizer é que todos nós temos os nossos telhados de vidro, e que cuspir para o chão é um crime muito pequeno quando comparado com colonizar e escravizar metade do mundo.

Polémicas à parte, aquilo que para mim tem sido mais interessante nesta experiência é, sem dúvida, a forma como me permite questionar tudo aquilo que eu dava como adquirido em função da minha “matriz ocidental”. Nós habituamo-nos a olhar para nós mesmos como o centro do Mundo. Estudamos a História Europeia e chamamos-lhe História Mundial e os nossos role-models pertencem cada vez mais à elite cultural dos ex-colonizados norte-americanos.

Esta experiência na China tem-me permitido mergulhar numa cultura que se vê a ela própria, em função da dimensão do país e das história milenar, como o Centro do Mundo. Com a vantagem de nos conhecerem muito melhor a nós do que nós a eles. Os ídolos mundiais ocidentais do desporto e da música, por exemplo, até podem ser famosos aqui. Mas não substituem os ícones pop chineses e coreanos.

Aqui é estranho comer de faca e garfo, é considerado de gosto muito duvidoso usar as mãos para comer (e nós, ocidentais, usamo-las muitas vezes) ou assoar o nariz a um lenço.
A nossa comida é estranha. Da mesma forma que as pessoas que me visitam gostam de comer nos restaurantes locais “pela experiência” mas refugiam-se na comida ocidental o mais depressa que podem, também os chineses que visitam a Europa recorrem quase em exclusivo aos inúmeros restaurantes do seu país de origem que podem encontrar.

[A título de curiosidade, este fim-de-semana, no aeroporto de Xangai, vi uma família chinesa, com problemas de excesso de bagagem, a transportar quantidades de noodles instantâneos e carnes secas suficientes para alimentar um pequeno exército durante 2 semanas.]

É tentador olhar para os chineses com olhos de ocidental e perguntar-lhes porque é que eles ainda usam pauzinhos para comer. Mas, muito mais interessante, e também mais difícil, é olhar para nós próprios com olhos de chinês e perguntar porque é que nós usamos faca e garfo. (metáfora inspirada em factos reais)

quarta-feira, 11 de julho de 2007

Gosto de ir a Xangai porque...

... posso almoçar picanha num restaurante brasileiro e jantar bacalhau num restaurante português!